*. o niilismo não é reconhecer q não há nenhuma universalidade, nenhuma natureza, nenhum valor superior, nenhum “processo de desvalorização” do q seria superior: o niilismo é a forma, a força, de existência da ocidentalidade em todas as suas instâncias: não é uma queda, uma inferiorização ou banalização seja do mal, das mercadorias, do corpo, do desejo, das instituições: o niilismo não pode ser ultrapassado: ele é a “alma”, o “espírito”, a matéria viva y morta, a energia, o movimento, a expressão da ocidentalidade: não é sua derrota ou declínio: deixando de ser niilista a ocidentalidade deixaria de ser cristã, de ser feudal, de ser burguesa, de ser democrática, aristocrática, servil, escravista, trabalhadora, consumista, isto é, em termos gerais, deixaria de ser a ocidentalidade;
*. o niilismo não é uma “doença moral”, uma decadência, mas o próprio ethos enquanto pathos: todas as normoses ocidentais são niilistas y não podem ser diferentes: seu funcionamento é aniquilador;
*. niilismo como “vontade de nada” é um dos motores fundamentais da ocidentalidade: das forças descomunais das crenças gerais, postas em andamento por essa vontade, vontade também criada pelas crenças gerais, se formatam todas as coisas: é a ação de recorte do caos y manutenção da efetividade: desse nada tudo, porq esse nada é a própria vontade ocidental enquanto imaginários, redes de crenças em movimento y vibração, forças y buscas pelo “ser”, isto é, pelo nada: na busca insana pelo “ser” tudo é criado: o “mundo” é criado por essa força sem fundamento, por essas redes divinizadas (trabalho, deus, família, individualidade, sexo, prazer, mercadorias, fome, riqueza, alegria, felicidade, moral) q geram y são geradas por uma hipostasia polidimensional y circular: sem esse círculo vicioso nada seria criado na ocidentalidade: ao crer, ao crer q sua crença é poder, é real, é força, é obrigação, é necessária, é ordem, é normose, mesmo sendo sempre nada, sendo perverso y vazio embuste, tudo se move gerando o existente;
*. toda a “história da física” não passa de um capítulo da metafísica, isto é, um capítulo a mais na maneira de ser, de sempre mudar o mesmo pra manter o mesmo próprio da ocidentalidade: o niilismo aparece até mesmo onde não é evidente, como na física, nas ciências: sem seus sistemas de crenças integradas a outros sistemas de crenças, a ciência não existiria: enquanto imaginário y técnicas de produção a ciência faz parte constitutiva da “última apresentação” do niilismo ocidental [como se existisse outro], parte da metafísica, parte da necessária normose q produz, reproduz, cria, repete, movimenta, formata a efetividade [o real, o imediato, o tempo enquanto o q jorra dando dimensões a pele sobre o caos];
*. niilismo não é “viver para o nada e negar a vida”: são precisamente as formas de viver a vida q caracteriza o niilismo: negar ou afirmar a vida fazem parte do mesmo movimento, da mesma normose ocidental: tanto um quanto o outro não existem separados y são exigências inextirpáveis: o niilista não é o “o negador de valores, o ateu, o ressentido”, mas o sujeito, o cidadão, o homem normal, o comum, o silvestre cristão das múltiplas manadas: não é um “desperdício da força” ou uma “vontade de poder” reativa y fraca, mas um exercício coletivo das forças fundadas apenas em si mesmas, mas crendo em suportes imaginários perversos y inescapáveis: “afirmar a vida” ou “negar a vida” pra ocidentalidade sempre estiveram unidos, articulados, inseparáveis, necessários ao mesmo jorro vital de produção, reprodução y manutenção da efetividade: niilismo porq nada por baixo, nada adiante, nada enquanto sistema de crenças, imaginário, y tanta força criadora negativa, isto é, é o nada q geram as forças y as forças o nada: o lixo é o real;
*. a ocidentalidade criou y criará uma infinidade de formas de vida, de natureza, de Histórias, de corpos, de desejos, de justificativas, de homens, mas são partes do seu mesmo, do seu “espírito”, sua “metafísica”, do seu niilismo enquanto aquela vontade de nada [porq tudo q acredita ser real, objetivo, existente, verdade, valor, necessidade é apenas imaginário pra produzir, reproduzir, manter: a força, as forças y poderes q criam y reiteram o existente] q gera o “nosso mundo”: negativo y positivo, decadência y ascensão, vida y morte, deus y o diabo, macho y fêmea, força y fraqueza [ad infinitum] fazem parte do mesmo feixe geral de forças imaginárias q é a ocidentalidade: todo caminho, toda modificação segue seus trilhos: as revoluções y as reações fazem parte do mesmo;
*. o niilismo não é o mal, mas o bem-q-move: a literatura sendo uma luta contra o contra a ocidentalidade, contra o horror é uma luta contra o niilismo, sabendo q ela mesma faz parte (não duma decadência) do horror, q sua positividade radical contra a negatividade ocidental (sua forma de existência) não é pra instaurar “novos valores”, “nova sociedade”, mais uma outra Literatura, mas uma luta permanente contra o existente numa intensificação, inclusive contra si mesma, cada vez mais furiosa: a ocidentalidade não pode superar, ultrapassar, resolver, o horror, o niilismo, horror e niilismo q ela “é”, o furor de aniquilamento, de produção, de desgaste, de consumo, de destruição, de silenciamento, de comunicação, de trabalho y infestação é sua normose virótica, tendo invadido de tal maneira os “extraterrestres” [a terra, o planeta, o globo, a galáxia, o universo são visões da tribo, jamais universais ou em-si q se sustente sem a tribo] q consegue manter uma “humanidade” como uma espécie conflituosa de “unidade” [q um dia compreenderá q deve se unir ao ocidente integralmente y, de corpo, alma y desejo, marcharem juntos, unidos, colados, realizando a história, o espírito, a política, a economia, a religião, a moral, o bem-estar geral] a partir de si mesma, como réplica, repetição do mesmo: y enquanto “réplicas mestiças” existem y sobrevivem os “extraterrestres” extasiados num labirinto estranho, sem saída y sem a mesma entrada: o horror não gera nem aceita o outro, a alteridade radical, intransigente, autônoma, contumaz, obstinada, severa, q não negocia: enquanto não infesta, adoece, devora, apodrece, amansa, domestica, incorpora, remonta, não descansa, não cessa, não deixa, não larga, não desmorde;
*. o “vazio de sentido” existe de toda maneira em todo sentido porq nada sustenta ou justifica ele: tudo é “imposição de sentido”, normose y poderes, imaginário querendo se impor como universal y natural;
*. niilismo não é declínio, decadência, esgotamento, desagregação, degeneração: esses conceitos y seus correlatos são complementos dos seus contrários num imaginário sistêmico: niilismo é o conjunto inteiro em andamento, com seus começos y fins, destruições y criações, cristalizações y movimentos, filosofias, ciências, críticas, políticas. jogar o niilismo pra ser a decadência é deixar de ver o horror enquanto tribo.
*. a “vontade de nada” (poder criador) enquanto sistema de crenças, imaginário, toma todas as formas desejáveis y indesejáveis da tribo.
*. qualquer utopia da tribo [do reino de deus, passando pelo reino da razão y pelo reino dos trabalhadores até o atual reino do “consumo”: da “idade média” à “idade mídia”] é projeção perversa da própria tribo. só resta a resistência ativa, a guerrilha, o enfrentamento, o não radical a tudo, a afirmação plena contra a ocidentalidade [mesmo fazendo parte do horror não comunga, não festeja, não participa, não negocia, não reproduz, não aceita] sem antes ou depois: procurar o melhor, as brechas mais macias, os dias menos cheios, o melhor lugar y atirar, incendiar, infestar com “alteridades” como faz a ocidentalidade com o “mesmo”, com dubiedades, com erros de sistema, com vírus y minas de múltiplas explosões;
*. não a “desvalorização dos valores morais”, da “metafísica”, da “religião” ou da tradição, mas disso mesmo em suas formas y movimentos: não o declínio da “disciplina do espírito”, do “rigor da reflexão”, mas é exatamente o exercício desse rigor, dessa disciplina, desse espírito: não é o “caos”, a “explosão dos instintos”, o “consumismo”, o “desbragamento do prazer”, pois isso é normose, é querido, faz parte: como fazem parte todos os genocídios ocidentais, todas as torturas, todos os crimes, todas as humilhações, todas as dores, todos os silenciamentos, todos os rituais pra descansar as manadas pro trabalho, todas as formas de trabalho;
*. a ocidentalidade, a tribo, é o q vai se formando de redes complexas da “grécia” y do “helenismo”; do “império romano”; de traços da “religião hebraica”; dos “povos bárbaros”: y dessas “matrizes” y suas fusões, confusões, integrações, interferências: a tribo se configura pela “primeira vez” com aquilo q se denomina “feudalidade”, como sua “primeira forma histórica”, tendo somente os cristianismos como ponte em comum, como horizonte y poder com variantes lingüísticas, econômicas, políticas, filosóficas: seu “segundo momento” é o aparecimento, inda na “feudalidade” (lembrar q a tribo é essencialmente “européia”), da complexificação do capital y do mundo q vai sendo gerado por ele: feudalidade y capitalismo;
*. sem valores eternos, sem fundamentos metafísicos (quando até a física não passa duma metafísica de segunda categoria), sem uma natureza, sem um deus ou deuses, sem um homem [ad infinitum, novamente] não a decadência, simplesmente porq não houve um “tempo forte”, mais nobre, mais potente q isso q vivemos: o horror é sempre o mesmo, o q muda são suas aparições, a forma das suas manifestações, os discursos de explicação y apoio: o horror, a tribo y seus pilares sempre em rotação, continuam o mesmo, mas como é um mesmo em mutação-do-mesmo, temos a sensação de “revolução”, “modificação”, “superação”.
*. a moral, a ética, deus, religião não são nem nunca foram (o sempre da ocidentalidade não ultrapassa, no máximo, 1400 anos) nada mais do q niilismo institucionalizado, cristalizados, normoses postas como fundamento pra um exercício do horror com muito mais estabilidade, o q não foi preciso mais completamente quando o capital podia ser produzido sem essas “exterioridades” y “interioridades” ridículas y inúteis, bastava as manadas crerem q era “necessário” produzir, reproduzir, consumir, preservar por si mesmos: bastou um deslocamento imaginário do supra-sensível, do etéreo, dos imperativos metafísicos tradicionais, dos poderes de deus, da natureza, do espírito, pro estômago, pra carne, pro desejo, pro sexo, pras coisas [da “alma” pra “pura mercadoria”: duas manifestações da mesma “coisa”]: nenhuma negatividade destruidora y tradicionalmente niilista, mas apenas o niilismo reordenando o horror, q aparece agora travestido em outras carnes;
*. como jamais houve um “mundo verdadeiro” em oposição a um “mundo aparente”, um noumeno y um fenoumeno, um “tempo linear”, uma “história”, não pode haver “decadência”, o niilismo no seu sentido tradicional, mas sim niilismo constitutivo, caracterizador, explicativo, esclarecedor;
*. pra existir, pra continuar existindo, trabalhando, comendo, parindo, se relacionando, “precisamos crer em algo”, o q não quer dizer q esse algo seja verdadeiro, real, mas sim q creia eu q é real, verdadeiro, natural, moral, necessário: a força descomunal das ficções como criadoras, reprodutoras y guardiãs do existente [o nada sob o existente, o nada como tutano do existente, o nada como fim do existente] devem ser avaliadas mais profundamente: o nada criador, niilista, é a essência viva da ocidentalidade: o horror é esse nada se impondo como existência, imperativo, matéria, corpo, desejo, sonho, idéias, força como se não fosse nada, mas o q o nada faz aparecer.
*. niilismo não é “perder o sentido”, mas impor o nada como tudo. o niilismo não é “contra a vida”: a vida da tribo, a tribo da vida, é niilista. ele é a construção moral, religiosa, política, econômica, filosófica da tribo y as justificativas pra afastar a “consciência” do fundamento vazio, ficcional, mentiroso, falso dolorosamente, cansativamente, ansiosamente fútil, mas infinitamente poderoso, articulador de todas as forças y poderes, focalizador de todas as energias, alimentando, vestindo, habitando, movendo, produzindo, entretendo, ritualizando, pensando a tribo inteira y duma maneira virótica, violentamente infestando tudo q não é ela y nela mesma absorvendo tudo q não seja ela: o poder niilista da tribo é tão grande q agora, talvez, só exista concretamente ela [a vitória do sociodemonazifascismocristão].
*. os sistemas de crenças q em seus movimentos geram o real precisam da não-verdade, do ilusório, do entorpecimento, do ritual: y esse real é feito dessa matéria, não das estrelas, mas das mais tolas y ridículas razões, opiniões, noções, saberes;
*. a ocidentalidade, cristã em seu tutano (com razões, origens, metas y fim) y capitalista em sua carne (com fim, metas, origens y razões) ao perder a força básica do primeiro (a grande origem, as grandes metas, as grandes razões, o grande fim) y ficar com o terra a terra do segundo (a pequena origem, as pequenas metas, as pequenas razões, o pequeno fim) entra em crise y chama isso de niilismo, o q é falsear a questão, se eximir, covardemente deixar de ver a unidade, inda existente y necessária, dos “dois eixos” em consonância y movimento: a “angústia moderna” faz parte do sofrimento desocupado y caricato do primeiro, mais a grotesca y lacunar forma de vida do segundo: duas espécies niilistas: a única maneira de ser da ocidentalidade: todas as terceiras, quartas y quintas saídas são apenas composições dessas origens, metas, razões y fins: da manada pra manada: produção-reprodução é o q parece ser esse “organismo”, é como q parece se bastar esse corpúsculo patético: y tudo isso faz muito sentido (nada de niilista como um sem-sentido): origens, metas, razões, justificativas, saberes, classificações, fins tão todos dependentes dos fluxos do imediato do presente, q é desdobramento do mesmo enquanto tempo: y “mecanismos” específicos, de crenças, saberes y práticas, reverte ou reinveste toda “revolução”, “mutação”, “mudança”, “alteridade”, “negatividade radical” em ser apenas mais uma forma do mesmo: todo o investido na “mutação” tem q advir do tempo y da energia do imediato, q não nasce do nada, isto é, toda mudança y alteridade na tribo jorra das energias, dos poderes, das forças, dos nódulos discursivos da própria tribo y nelas y com elas a tribo se renova sem se renovar, se energiza, ganha sempre novas y mesmas origens, razões, metas y fins;
*. aqui podemos pensar de outra maneira uma noção equivocada de nietzsche, a do “eterno retorno”: a tribo é um “eterno retorno do mesmo”, mas esse mesmo não é jamais o “exato”, o retorno de “tudo como foi”, mas formas do mesmo, as infinitas formas do mesmo: só assim, y não da maneira nietzschiana, o eterno retorno pode ser “abissal”: é o horror. se pensarmos q o mesmo pode mutacionar em infinitas maneiras, com infinitas origens, razões, configurações, metas y fins, compreenderemos melhor a tribo.